Legislação e iniciativas

União Europeia

A União Europeia (UE) tem dado cada vez mais atenção à pobreza energética, procurando garantir proteção aos grupos mais vulneráveis. Nos últimos anos, foram apresentadas várias iniciativas com o objetivo de combater esta realidade, promovendo simultaneamente uma transição energética justa.

Um dos primeiros marcos foi o pacote legislativo “Energia Limpa para Todos os Europeus” (2019), que não só incentivou o aumento da eficiência energética e o uso de energias renováveis, como reconheceu, de forma clara, a necessidade de assegurar justiça para os consumidores, assumindo o combate à pobreza energética como prioridade. Este compromisso foi reforçado com o lançamento do Pacto Ecológico Europeu (2020) e a criação do Fundo para a Transição Justa, instrumentos fundamentais para garantir que ninguém fica para trás na transição climática.

Como parte das suas obrigações, os Estados-Membros da UE passaram a incluir nos seus Planos Nacionais de Energia e Clima (PNEC) a avaliação da pobreza energética. Vários países começaram a desenvolver definições próprias, métodos de medição e monitorização, bem como estratégias e soluções adaptadas às suas realidades nacionais.

Em 2020, para apoiar este processo, a Comissão Europeia publicou uma recomendação específica sobre a pobreza energética, integrada na Estratégia da Onda de Renovação, que tem como objetivo melhorar a eficiência energética dos edifícios na UE.

Mais recentemente, no âmbito do pacote Objetivo 55 (Fit for 55), foram introduzidas alterações importantes em várias diretivas europeias. Na Diretiva de Eficiência Energética (EED), foi estabelecida uma meta ambiciosa: reduzir o consumo final de energia em 11,7% até 2030, face às projeções de 2020. As novas regras aumentam as obrigações anuais de poupança energética e promovem uma redução mais acentuada do consumo no setor público.

Na Diretiva de Desempenho Energético dos Edifícios (EPBD), embora a revisão não tenha sido tão ambiciosa quanto o esperado, introduziu marcos claros para 2030 e 2035, com vista à neutralidade climática até 2050. Foram ainda incluídas disposições como a eliminação progressiva dos combustíveis fósseis nos edifícios (incluindo esquentadores) e a obrigatoriedade da instalação de painéis solares em edifícios não residenciais, com algumas exceções para edifícios públicos. A versão revista da EPBD (UE/2024/1275) entrou em vigor a 28 de maio de 2024 e visa acelerar a renovação dos edifícios, com especial foco nos que apresentam pior desempenho energético.

Paralelamente, no âmbito da revisão da Diretiva do Comércio Europeu de Licenças de Emissão (CELE), foi criado um novo sistema — o CELE 2 — que entrará em vigor em 2027. Este novo mecanismo abrangerá as emissões de CO₂ associadas à queima de combustíveis em edifícios, transportes rodoviários e pequenas indústrias atualmente fora do CELE tradicional.

O CELE 2 operará com base no sistema de “cap and trade”, aplicando-se aos fornecedores de combustíveis. Todos os direitos de emissão serão leiloados, e uma parte significativa das receitas será destinada ao Fundo Social para o Clima, criado para apoiar famílias vulneráveis e microempresas para mitigar os impactos sociais da entrada em vigor da CELE 2. Os restantes fundos deverão ser canalizados para medidas climáticas e sociais, e os Estados-Membros serão obrigados a prestar contas sobre a sua utilização.

Estas iniciativas demonstram a preocupação em conciliar ação climática com justiça social, garantindo que a transição energética é verdadeiramente inclusiva e equitativa para todos os cidadãos.

 

Portugal

Portugal tem vindo a reforçar os seus esforços, em articulação com a União Europeia, para combater a pobreza energética e promover a eficiência energética como um pilar fundamental da transição climática justa.

Um dos principais instrumentos nesta área é o Plano Nacional de Energia e Clima 2030 (PNEC 2030), cuja primeira versão foi aprovada pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 53/2020. Em conformidade com o Regulamento da Governação da União da Energia e da Ação Climática, os Estados-Membros são obrigados a rever periodicamente os seus planos, aumentando o nível de ambição das metas climáticas.

Assim, Portugal atualizou recentemente o seu PNEC 2030, num processo participativo que incluiu uma consulta pública entre 22 de julho e 5 de setembro de 2024. A nova versão foi aprovada para envio à Assembleia da República através da Resolução do Conselho de Ministros n.º 149/2024, de 30 de outubro, nos termos da Lei de Bases do Clima. Este é um momento político importante, que permite rever as metas e procurar uma ambição reforçada a nível nacional e europeu.

Complementarmente, o país conta com o Roteiro para a Neutralidade Carbónica 2050 (RNC2050), que traça a visão e os caminhos para alcançar a neutralidade carbónica até 2050, equilibrando emissões e remoções de gases com efeito de estufa.

No que diz respeito à eficiência energética dos edifícios, Portugal aprovou em 2021 a Estratégia de Longo Prazo para a Renovação dos Edifícios (ELPRE). Adicionalmente, em novembro de 2023, foi aprovada em Conselho de Ministros a Estratégia Nacional de Combate à Pobreza Energética, publicada oficialmente em janeiro de 2024. Esta estratégia visa responder de forma estruturada aos desafios enfrentados pelas famílias em situação de vulnerabilidade energética.

Como parte desta abordagem, foi também criado o Observatório Nacional da Pobreza Energética (ONPE-PT), através da RCM n.º 11/2024. A sua missão é acompanhar e analisar a evolução da pobreza energética em Portugal, contribuindo para políticas públicas mais eficazes e baseadas em evidência.

Entre as medidas concretas já implementadas destacam-se:

  • A Tarifa Social de Energia (TSE) para eletricidade e gás natural e a iniciativa da Bilha Solidária;

  • Os programas do Vale Eficiência, promovidos pelo Fundo Ambiental (Fase I: 2021-2023 e Fase II: 2023-2025);

  • A criação dos Espaços Energia, balcões únicos de apoio ao cidadão em matéria de eficiência energética, no âmbito do PRR (medida TC-r44).

Para além das políticas públicas, várias organizações da sociedade civil, centros de investigação e redes europeias estão ativamente envolvidas no combate à pobreza energética, promovendo projetos de proximidade e inovação social. Entre as iniciativas destacam-se o  Energy Poverty Advisory Hub, Powerpoor, Right to energy, Warm homes for all, Social Watt.

Estes avanços mostram que o combate à pobreza energética em Portugal está a ganhar relevo político, com instrumentos cada vez mais articulados, abrangentes e orientados para a justiça social e climática. A próxima década será decisiva para garantir que ninguém fica para trás na transição energética.